Casos de pessoas dopadas ao ingerirem alguma droga misturada com suas bebidas são muitos. Sedar ou gerar sonolência no indivíduo, involuntariamente, tornando-o vulnerável a roubos, violências, estupros e até assassinatos, tem se tornado cada vez mais comum.
O tipo de substância usada, no conhecido golpe “Boa noite, Cinderela”, é difícil identificar: a droga não tem cor nem cheiro, tampouco altera as características da bebida em que é misturada.
Uma nova iniciativa, porém, dá um primeiro passo para evitar que casos assim continuem a existir. E surgiu a partir da preocupação de quatro adolescentes, alunas do ensino médio. Elas criaram um copo que acusa quando uma bebida é alterada, divulgou Universa da VOL.
Preocupadas com a segurança de mulheres e inspiradas a solucionar um problema da sociedade em um programa escolar, as estudantes do 2° ano do ensino médio do colégio do Rio Grande do Sul: Natally da Silva Souza, 16, e Nicolli Marques, Giovanna Moraes e Giovanna Avila, de 17 anos, pensaram em desenvolver um projeto em que fosse possível que a droga fosse identificada pela vítima
Innovar para resolver um problema
Natally explica com surgiu a ideia. “No ano passado, durante as aulas de matemática, a gente começou a fazer um trabalho sobre economia e tinha que criar uma empresa, listar os gastos, entre outras coisas.
Criamos nossa equipe e, nas pesquisas para encontrar um tema, vimos vários problemas da sociedade e, entre eles, os relatos de pessoas que foram dopadas. Teve gente sequestrada, roubada e até estuprada”, conta Natally.
“Decidimos criar algo inovador e que trouxesse um benefício para a sociedade. Foi quando pensamos em um copo que acusasse a presença da droga GHB (Ácido Gama Hidroxibutírico), conhecido popularmente como ‘Boa Noite Cinderela’'” disse Natally da Silva Souza, estudante do ensino médio.
A GHB tem ação anestésica e sedativa, pode ser encontrado sob forma de líquido, é incolor e não tem cheiro.
No mundo, a substância é classificada como “droga do estupro”, por ser misturada na bebida de pessoas com o intuito de dopá-las.
Como funciona o copo?
Como explica a jovem, o copo deve ter uma base que, em contato com a droga, dará início a uma reação química. Ela explica que quando o GHB, substância do ‘boa noite, Cinderela’ , encontra a outra substância, o líquido muda de cor e alertará imediatamente à pessoa que algo foi colocado na bebida.
Para quem não conhece, o GHB é a droga usada para dopar pessoas sem que elas percebam, com o objetivo de adormecer e apagar a memória da vítima e, assim, cometer crimes sem deixar provas.
“Nossa ideia é que o reagente fique na base do copo na forma sólida, podendo, assim, ser usado mais de uma vez. Isso deve levar maior segurança para as pessoas nas festas. E, caso sejam vítimas desses crimes, elas terão uma prova física”, destaca.
O copo foi apresentado na Mostra Sesi Com@Ciência 2022, que aconteceu em Porto Alegre e reuniu 175 projetos de estudantes do ensino médio e do Educação de Jovens e Adultos (EJA). A equipe composta pelas quatro alunas do 2º ano do ensino médio do Sesi Gravataí apresentou um protótipo que reage ao contato com o GHB.
O desafío
Após testes e pesquisas, as adolescentes identificaram que o utensílio poderia ser produzido em polipropileno, um material degradável e sustentável. O maior desafio era encontrar uma substância que apontasse a droga.
Atualmente, a equipe está usando o Dragendorff (um reagente colorido). No entanto, elas esbarraram em outro desafio: reduzir possíveis efeitos colaterais, uma vez que o reagente também é tóxico.
As pesquisas sobre o reagente estão sendo positivas, apontam as jovens. Em breve, o processo de testes avançará para as próximas fases, no próprio copo. Sobre efeitos colaterais, Natally esclarece que é difícil encontrar um reagente que seja compatível com o GHB e que não traga reações adversas. Por essa razão, o trabalho está focando em um meio de utilização sem que o usuário entre em contato com a substância tóxica.
“Caso o reagente não dê certo, a gente já pensou em alternativas. Estamos em contato com um laboratório de robótica e pensamos em fazer um compartimento no fundo do copo, de uns dois milímetros, no qual entre um pouco de bebida. Ali, ocorrerá a mistura com esse reagente. O compartimento permitirá a entrada da bebida, mas impedirá que ela retorne à parte de cima, evitando que o usuário consuma o resultado da reação química”, detalha.
Trabalho tem “grande potencial”, diz professor
Orientador do projeto, o professor de química Rafael Abruzzi conta que a ideia das meninas de elaborar um equipamento que mude de coloração e identifique uma possível adulteração na bebida faz parte programa Jovem Cientista do Sesi Gravataí.
Ainda segundo Universa da VOL, o professor explica que trabalho está em fase inicial, mas que tem um grande potencial. “As meninas definiram a droga e, agora, estão analisando os materiais para a produção do copo, assim como os reagentes que poderiam fazer a identificação e como esses poderiam ser incorporados ao copo para a mudança de cor”, diz.
“A ideia é realizar testes colorimétricos em laboratório com diferentes substâncias e, depois, verificar o comportamento delas no copo”, destaca.
Não há previsão para que o produto chegue às festas e bares, mas, se depender das jovens cientistas, o crime do “boa noite, Cinderela” está com os dias contados.
Dicas para evitar ser vítima
O doutor Marcos Vinicius Borges Tadeu, infectologista formado pelo Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Minas Gerais, orienta a sociedade para que se proteja dos criminosos, cuidem de si e seus pares.
1- Não aceite bebidas de estranhos. Muitas pessoas fingem que estão bebendo com você ou mesmo embriagadas, mas não estão. Apenas para te enganar. Esteja atento. Compre suas próprias bebidas e pegue-as no balcão.
2- No caso de bebidas com lacre, sempre verifique se não está violado, inclusive por questões sanitárias.
3-Não consuma sua bebida se ela tiver ficado sozinha enquanto você foi ao banheiro.
4-Tente sempre manter seu copo no campo de visão.
5-Mantenha-se sempre bem hidratado e bem alimentado, isso ajuda a diminuir o efeito de algumas substâncias, mas a proteção é baixa.